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O Setorial de Transportes do PT nasceu junto com o Partido dos Trabalhadores. O objetivo sempre foi o de fomentar políticas públicas para o transporte coletivo e logística para distribuição de mercadorias. Estamos abrindo esse espaço para ampliar a discussão sobre o tema.

terça-feira, 15 de março de 2011

Obama vai investir em TAVs

O presidente Barack Obama deseja atualizar o sistema de transporte americano usando trens de alta velocidade, trazendo para os Estados Unidos um gosto de algo que é rotineiro na vida na Europa e na Ásia. Mas o país, obcecado por carros, está dividido em relação aos planos. O projeto gigantesco está fadado ao fracasso?


O vice-presidente dos Estados Unidos, Joseph Biden, é o mais famoso usuário de transportes públicos do país. Isso lhe rendeu o apelido de "Amtrak Joe". Várias vezes por semana, Biden toma o trem da Amtrak de Wilmington, Delaware, até a histórica Union Station em Washington, DC. Dizem que o democrata já conhece o primeiro nome de todos os fiscais da linha.

Biden deve ter ficado satisfeito quando apresentou o novo plano de trem de alta velocidade na 30th Street Station na Filadélfia, no mês passado. O governo planeja gastar US$ 53 bilhões em ferrovias e trens de passageiros nos próximos seis anos. Grande parte do dinheiro está destinada a novas conexões de alta velocidade. A meta é que 80% dos americanos tenham acesso a "trens-bala" até 2035.

Essas maravilhas reluzentes de alta tecnologia poderiam correr entre San Francisco e Los Angeles em velocidades de até 350 quilômetros por hora. Os planejadores esperam reduzir o tempo de viagem entre Washington e Boston para menos de quatro horas. A linha em forma de T no Texas ligaria Dallas, Houston e San Antonio. O plano prevê a elevação de centenas de quilômetros da chamada "Texas T-Bone", para que gado possa passar sob os trilhos.

"É um investimento inteligente na qualidade de vida para todos os americanos", diz Rick Harnish, da Associação de Ferrovias de Alta Velocidade do Meio-Oeste, em Chicago. Pessoas do setor, como Ansgar Brockmeyer, da divisão de trens de passageiros da Siemens Mobility da Alemanha, estão empolgadas com esta renascença das locomotivas. "Há razão para otimismo", ele diz.

Mas as forças conservadoras do país estão determinadas a impedir a visão tecnológica do presidente Barack Obama. Pelo menos três governadores recém-eleitos (dos Estados de Wisconsin, Flórida e Ohio) rejeitaram completamente a injeção de dinheiro nas ferrovias do país planejada por Washington.

Na verdade, é difícil dizer se os trens há muito abandonados dos Estados Unidos conseguirão retornar. Grandes partes da rede estão em estado precário e a maioria dos americanos há muito passou a viajar de carro ou avião.

Mas foram as ferrovias que permitiram aos seus antepassados conquistarem o Velho Oeste. Os serviços de trem foram lucrativos nos Estados Unidos até os anos 50. Muitas linhas eram lendárias, como a Santa Fe Super Chief, que levava seus passageiros de Chicago até Los Angeles em luxo. Astros de cinema como Elizabeth Taylor, Lauren Bacall e Humphrey Bogart dormiam em elegantes vagões-dormitório e jantavam com qualidade cinco estrelas.

O California Zephyr é outro serviço clássico, com sua rota se estendendo por quase 4 mil quilômetros do Meio-Oeste até San Francisco. Carros com "vista dome" (domo panorâmico) dão aos passageiros vistas panorâmicas de 360 graus do Rio Colorado, das Montanhas Rochosas e de Sierra Nevada. Uma equipe de elite de atendentes, chamadas de "Zephyrettes", serve bebidas e até mesmo se oferece para servir como babá.

O Zephyr funciona até hoje -mas a viagem de 51 horas a torna atraente apenas para os fãs de trens. Um desses fãs é James McCommons, da Universidade do Norte de Michigan. O acadêmico passou um ano cruzando os Estados Unidos de trem antes de narrar suas experiências em um livro. "É embaraçoso", ele diz. "Nós já fomos a maior nação ferroviária do mundo e atualmente nem mesmo fabricamos um único vagão de trem no país."

O escritor americano James Kunstler se queixa de que a "Amtrak se tornou motivo de riso no mundo". Ele brinca que a empresa claramente "criou um modelo de gestão soviético, com uma camada adicional de Lei de Murphy para assegurar entropia máxima no serviço". De fato, os trens da Amtrak atualmente levam mais de 11 horas para cobrir os 600 quilômetros de San Francisco até Los Angeles.

Os planos de trem de alta velocidade são, portanto, uma espécie de alerta nestes tempos cautelosos. Muitos americanos se surpreendem ao descobrir que o presidente Obama parece estar falando sério sobre investir em peso nas ferrovias. "Eu não entendo esse fascínio por trens", diz Michael Sanera, da Fundação John Locke, um centro de estudos de livre mercado. Ele só tem uma explicação: "Eu acho que há muita frustração em homens que não ganharam aquele trenzinho quando eram pequenos, e agora querem brincar com trens".

Mas com um olhar mais atento é fácil ver quão séria a situação se tornou. Os Estados Unidos estão diante de um engarrafamento. Segundo um estudo da Comissão de Receita e Política Nacional de Transporte por Superfície, os Estados Unidos precisarão de nove aeroportos do tamanho do gigantesco Aeroporto Internacional de Denver e dobrar o número de quilômetros de estradas interestaduais caso a demanda por transporte continue crescendo na taxa atual nas próximas décadas. Em 2009, as pessoas de casa ao trabalho nos Estados Unidos gastaram 5 bilhões de horas presas em congestionamentos. São sete vezes mais do que em 1982.

"Daqui quatro décadas, os Estados Unidos terão 100 milhões de habitantes adicionais", alerta o secretário dos Transportes americano, Ray LaHood. "Se nos acomodarmos com estradas, pontes e aeroportos que já estão sobrecarregados e são insuficientes (...) nossa próxima geração encontrará artérias de comércio intransitáveis na América." Ele considera essenciais os trens de alta velocidade.

Especialistas ferroviários americanos identificaram 10 corredores nos quais trens de alta velocidade operariam teoricamente de modo lucrativo. A mais promissora dessas rotas fica no Nordeste do país, entre Nova York, Filadélfia, Baltimore e Washington, DC. Como as distâncias são relativamente curtas e há alta demanda, trens-bala poderiam explorar suas vantagens na região.

Também há uma necessidade relativamente urgente por conexões de trem no Meio-Oeste, como entre Chicago e Saint Louis, por exemplo. Apesar dos voos entre as duas cidades levarem pouco mais de uma hora, Harnish diz que demoras como o check-in e a segurança podem facilmente fazer a viagem demorar três horas. Em comparação, uma linha de trem de alta velocidade poderia cobrir a distância em menos de duas horas. Os planejadores acreditam que a rota poderia servir até um milhão de passageiros por ano.

"Na Europa, nós vimos que conexões ferroviárias de alta velocidade de menos de quatro horas podem ser competitivas", diz Ansgar Brockmeyer, da Siemens. A linha de alta velocidade entre Barcelona e Madri, que começou a funcionar no início de 2008, já conquistou metade da fatia de mercado das companhias aéreas. Em 2006, os trens Velaro de fabricação da Siemens percorriam a linha em velocidades acima de 400 km/h.

A Siemens agora espera vender o mesmo modelo de trens nos Estados Unidos. Os californianos são renomados por terem consciência ambiental e gostarem de tecnologia - até mesmo Arnold Schwarzenegger gostou de tomar o trem quando foi governador do Estado. Tudo isso criou condições favoráveis para a Autoridade de Ferrovias de Alta Velocidade da Califórnia (CaHSRA), que deseja implantar 1.300 quilômetros de trilhos de alta velocidade, ligando mais de 25 cidades no processo. As obras em um trecho de 100 quilômetros da nova linha devem começar em 2012.

"Nosso tempo de viagem de Los Angeles a San Francisco será de duas horas e 40 minutos, sem paradas", diz Rachel Wall, da CaHSRA. "Qualquer um que já percorreu essa rota sabe que de carro ou avião leva mais tempo."

Até recentemente, o setor nutria grandes esperanças na Flórida. As empresas responsáveis pela instalação dos trilhos esperavam que as obras começariam antes do final do ano para a linha entre Tampa e Orlando. Isso poderia criar potencialmente milhares de empregos. Mas o governador Rick Scott matou o projeto. Caro demais e arriscado demais é como o governador republicano o caracterizou, apesar de posteriormente ter prometido reconsiderar sua decisão.

Muito está em jogo para o presidente Obama. Os trens-bala faziam parte de sua campanha eleitoral de 2008. Mais recentemente, ele prometeu projetos ferroviários em seu último discurso do Estado da União. O presidente teme que o país fique atrás de seus rivais. A China, por exemplo, planeja construir impressionantes 13 mil quilômetros de linhas de trem de alta velocidade até 2020. Ela está investindo o equivalente a mais de US$ 300 bilhões nesta tarefa hercúlea.

Pequim recentemente demitiu o ministro das Ferrovias, Liu Zhijun, depois de supostas alegações de corrupção. Os leitos de concreto dos trilhos aparentemente foram feitos de modo negligente.

Mas isso não reduziu o entusiasmo pelo programa. De 2012 em diante, os trens transportarão passageiros de Pequim a Xangai em menos de cinco horas. Os trens da Amtrak atualmente cobrem uma distância semelhante entre Nova York e Atlanta em 18 horas.

McCommons, o fã de trens, culpa a postura americana pelo estado deplorável do sistema ferroviário de seu país. "Foi vendida a nós essa ideia bizarra de que apenas automóveis e aviões podem atender todas as nossas necessidades", ele diz. Isso dificilmente causa surpresa, já que duas gerações de americanos cresceram quase que totalmente sem trens de passageiros. "Não está na imaginação deles tomar um trem", ele explica.

O vice-presidente Biden pode, portanto, ainda se considerar um pioneiro por viajar para o trabalho de trem. Ele frequentemente toma o Acela Express para Washington, a única linha ferroviária nos Estados Unidos que pode ser considerada de alta velocidade.

A viagem de Biden cobre uma rota de quase 180 quilômetros de Wilmington a Washington em 75 minutos. A velocidade média: cerca de 140 quilômetros por hora.


El País

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